O diabo mora nos detalhes...

Capitulo I

Era uma vez uma pequena e recôndita aldeia esculpida nas serranias, longe do tempo e das notícias. Distante nas linhagens do povoado, tanto que já ninguém se recordava ao certo da sua nacionalidade, nem da sua herança rácica.

Um conjunto de casas aglomerava-se em muralha, de tal modo que todas as portas e janelas se viravam para o interior do povoado, e nenhuma casa tinha abertura de vista para as cercanias, tirando a torre da igreja, que também servia de torre de vigia. Eram uma comunidade de costas viradas para o mundo,a seu modo, auto suficientes.
Apenas um caminho rasgava passagem nos profundos vales e ravinas para o mundo exterior.
Nesse dia, no final das suas missões agrícolas, os lavradores recolhiam dos retalhos trabalhados de terra para as suas casotas geminadas. O lusco fusco pouco permitia à luz escapar-se e o trabalho ficou assim encerrado nesse dia. Os olhos já não recolhiam do sol o alimento para os guiar.
Com as alfaias carregadas às costas e a passo pachorrento, apenas um dos homens do grupo reparou numa silhueta que se atrevia sozinha, calcorreando caminho pela serra em passo descontraído.
"Oh pá!Qém é a alma penada que desce sobre o casario acompanhada do escuro??"
O grupo estacou, a olhar, a procurar. E era mesmo verdade. Alguém se aproximava!
Mas quem raio seria? Os ciganos mercantes já tinham passado por lá este mês! E o caminho não levava a mais lado nenhum que não à aldeia, portanto não seria um viajante. Tanto que nem existia albergue para as pernas cansadas dos que por ali passavam, pois esses nunca tinham surgido, e no fundo, nas vizinhanças, todos sabiam que ali ninguém era bem-vindo.
Apressaram-se para casa e espalharam a palavra.
Ouviram-se os ferrolhos das portas e janelas, e as poucas pessoas que ainda estavam na rua, recolheram-se a passo ligeiro para o interior das casas de pedra escura.